Fabão encara artes marciais para manter o corpo
em dia (Foto: Arquivo Pessoal)
Quem vive do esporte não pode parar nunca. Foi com essa filosofia que, aos 36 anos, o zagueiro Fábio Azevedo, mais conhecido como Fabão, levou a vida enquanto pensava no futuro em Goiânia. Depois de a negociação com o Mamoré Esporte Clube, de Patos de Minas (MG), não ser concretizada, o campeão mundial pelo São Paulo chegou a negociar com equipes em Goiás, mas acertou mesmo com o Sobradinho (DF), que disputa o Campeonato Brasiliense. E para chegar à nova casa com o fôlego em dia, o jogador buscou formas alternativas de treinamentos: MMA, boxe, jiu-jitsu, muay-thai. As artes marciais mantiveram o corpo do zagueirão em dia.
Longe dos gramados desde abril, após a saída do Comercial de Ribeirão Preto, o defensor trocou as chuteiras pelas luvas de boxe. Mas Fabão garante que a nova atividade foi apenas para manter o preparo físico. Lutar a sério, nem pensar.
– Acho interessantes as artes marciais, mas não gosto de lutar para valer. Meu negócio é futebol, até porque tenho duas placas de metal na cabeça e preciso tomar cuidado. Se eu sofrer uma pancada mais forte, não vai dar certo – brincou.
Fabão avisa: a volta aos gramados é a prova de que a palavra aposentadoria passa longe dele. O zagueiro se sente apto a seguir jogando sem dever nada aos colegas e adversários.
– Gosto muito de jogar futebol e sei que ainda posso ajudar, pois estou fininho e tenho condições. Enquanto a cabeça mandar e o corpo responder, vou continuar jogando – contou Fabão.
Fabão (D) é apresentado pelo Sobradinho, do Distrito Federal (Foto: Divulgação)
A relação com o São Paulo
Além de se dedicar aos treinos de artes marciais, Fabão passou o tempo anterior ao acerto com o Sobradinho cuidando da administração, em Goiânia, de algumas casas que construiu enquanto estava à frente de uma construtora que tem em sociedade com o volante Josué, ex-companheiro tricolor.
A presença do São Paulo na vida do zagueiro, claro, não para por aí. Fábio reconhece que a passagem pelo time paulista foi o divisor de águas em sua carreira. Após tantas glórias com a equipe, é o time que está no coração do atleta e também na preferência das suas três filhas. A escolha, consequentemente, gera algumas felicitações e brincadeiras.
Nos treinos, reverência e brincadeiras sobre o São
Paulo (Foto: Arquivo Pessoal)
– Independentemente do time em que estou, sou lembrado por minha temporada no São Paulo. Em alguns momentos sou admirado e parabenizado, mas em outros sou motivo de brincadeira, principalmente por parte dos corintianos na academia de MMA. O apelido de ‘Bambi’ reina. Mas sou um cara muito brincalhão e que faz amizade fácil, então entro na zoação também.
Por levar a vida de forma descontraída, o jogador não desanima com os dissabores da profissão. Atualmente, tem um processo na Justiça contra o Comercial por falta de pagamento. Fabão chegou ao clube no início de janeiro de 2012 para disputar o Campeonato Paulista. Nos três meses em que ficou, recebeu apenas um salário.
Mas o que prevalece da carreira no futebol são memórias boas. Antes de se tornar o Fabão, o zagueiro do São Paulo que conquistou importantes títulos, foi vitorioso em outras equipes nacionais e internacionais.
De Fábio a Fabão
Natural de Vera Cruz, na Bahia, o zagueiro, que antes era centroavante no futebol de várzea, começou no Bahia em 1994. Com a ajuda do treinador Evaristo de Macedo, Fabão foi levado para o Flamengo em 1998. Para o jogador, enfrentar a capital do Rio de Janeiro foi um choque cultural.
Títulos | Clube |
- Carioca (1999 e 2000) - Copa Mercosul (1999) | Flamengo |
- Copa Centro-Oeste (2002) - Goiano (2002) | Goiás |
- Paulista (2005) - Libertadores (2005) - Mundial de Clube (2005) - Brasileiro (2006) | São Paulo |
- Copa Imperador (Campeonato Japonês - 2007) | Kashima Antlers |
No entanto, aos poucos, e com a ajuda de alguns atletas da Gávea, principalmente Romário, a adaptação foi tranquila. Apesar de o primeiro contato com o tetracampeão mundial ter sido um pouco desconfortável, segundo Fabão.
– Alguns jogadores costumavam sentar nos mesmos lugares no ônibus, e todo mundo respeitava isso. Mas eu não sabia. Então, o Ricardo Rocha (zagueiro) pediu para eu ficar no banco em que o Romário sempre sentava. Quando ele chegou e me viu lá, todos começaram a rir e já soltaram: "Tá vendo, Baixinho? Nordestino, quando chega, é assim, toma a vaga mesmo" – relembrou, aos risos.
Jogando por dois anos no Flamengo, o zagueiro conquistou os primeiros títulos na carreira ao lado do xerife Ricardo Rocha. Outra oportunidade que o time rubro-negro deu ao zagueiro baiano foi a chance de atuar no futebol europeu.
Depois de participar de dois amistosos na Espanha com a equipe da Gávea, Fabão chamou a atenção. A transferência para o Bétis foi acertada. Porém, ele lembra que a ida para o Velho Mundo não foi como costuma acontecer. Muito pelo contrário.
– Na verdade, eu fui para o Bétis porque o Flamengo não tinha dinheiro para pagar o empréstimo do Denilson. Então, em um acordo entre as duas diretorias, eu fui mesmo para quitar uma dívida – contou.
Ainda na Espanha, o zagueiro também atuou no Córdoba. Em 2002, retornou para o Brasil e vestiu a camisa do Goiás, onde foi campeão goiano e da Copa Centro-Oeste. Três anos depois, assinou com o São Paulo. Com o Tricolor paulista, o jogador levantou a taça do Mundial de Clubes e da Libertadores, em 2005, sendo o autor de um dos gols na semifinal contra o River Plate (relembre no vídeo ao lado) e na final com o Atlético-PR.
Zagueiro fazer gol é difícil. Quando conseguia balançar a rede do adversário, Fabão tinha que fazer uma comemoração inusitada. Por isso, a da semifinal da Libertadores teve um gosto especial. Segundo Fabão, a esposa estava no oitavo mês de gestação da segunda filha.
– Sempre gostei de comemorar de um jeito diferente, mas essa não podia faltar. Hoje a Mariana tem sete anos e sabe que aquele gesto foi para ela – disse.
Além de ser um dos heróis na Libertadores, Fabão ficou marcado por quebrar o jejum de 15 anos sem título no Brasileiro. Em 2006, o time paulista foi campeão em partida contra o Atlético-PR. O zagueiro foi autor do único gol da equipe (Veja vídeo ao lado) paulista no empate por 1 a 1. Mas o clube multicampeão depois viveu um período de vacas magras, encerrado com a recente conquista da Sul-Americana. Fabão observa o ex-clube de longe e vê uma mudança na formação dos elencos.
– Antes, não só no São Paulo, os times tinham jogadores de nome. Davam prioridade àqueles que mais tinham experiência no mundo da bola. Hoje, infelizmente, a situação é outra. Por conta dos empresários, preferem trabalhar os garotos desde a base e depois vendê-los para o exterior. É esse o objetivo. Talvez por isso os times têm enfrentado algumas crises – opinou o zagueiro.
Japão e China
Depois da experiência e dos títulos no clube paulista, Fabão se arriscou no futebol do outro lado do mundo. Em 2007, assinou com o Kashinha Antlers, do Japão. No mesmo ano em que chegou ao clube, participou da conquista da Copa Imperador. Porém, a passagem no time japonês também ficou marcada por uma grave lesão que o afastou dos gramados. Fabão quebrou a fíbula e lesionou os ligamentos do tornozelo esquerdo. Mesmo assim, o zagueiro gosta é de lembrar das coisas boas que viveu, das experiências e das amizades.
– Não tive dificuldade em me adaptar, pois, além de o treinador ser o Oswaldo de Oliveira, boa parte da comissão técnica era brasileira. No início eles me encaravam, principalmente no vestiário (risos), mas depois me tornei amigo dos jogadores a ponto de ter abertura para brincar com todos. Fui muito querido lá, prova disso é que durante a minha despedida muitos deles choraram.
O zagueiro conta ainda que o futebol japonês e o chinês, onde atuou em 2011 no Henan Jianye, são bem diferentes. Quando a questão é disciplina, eles seguem à risca o que é repassado.
– Eles trabalham muito e, às vezes, temos a impressão de que estamos em um quartel. Mas a disciplina é admirável. Eu tinha certo preconceito, pois achava que eles não entendiam nada de futebol. Acabei percebendo que não era bem assim. Os chineses, por exemplo, podem não ter tanto domínio da bola, mas correm muito, e isso também é importante nos jogos – explicou.
De volta ao Brasil
Fabão após choque com Apodi
(Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com)
Antes de ir para a China em 2011, Fabão foi convidado pelo então técnico do Santos, Emerson Leão, a fazer o tratamento da perna lesionada no clube. Foi contratado e confirmado como reforço para a Libertadores em 2008. Porém, não foi dessa vez que colocou novamente a mão na taça.
Aos 34 anos, Fabão ainda assumiu outro desafio. Foi anunciado como nova contratação do Guarani para a disputa do Brasileiro de 2010, mas, além de a equipe ser rebaixada, Fabão guarda uma lembrança eterna da equipe. Após um choque com o lateral-direito Apodi, o jogador sofreu uma fratura e carrega duas placas de metal na cabeça.
– Foi um susto, mas faz parte do futebol. Fiquei dois dias internado na UTI, mas estou bem e sem sequelas. Mas o engraçado disso tudo é que o Apodi já tinha o apelido de “cabeça de jaca”. Depois dessa trombada, aí que o nome pegou mesmo. Começamos também a falar que ele quebrava pedra com a cabeça – brincou.
De bem com a vida, o zagueiro retorna aos gramados em 2013. E provavelmente para mais um passo na carreira - não o último.
– Se será a minha despedida? Eu não sei. A única coisa de que tenho certeza é que ainda posso jogar futebol.